Santuário de Cristo Rei… Ponto de encontro com as nossas raízes
Pe. José Carlos Caetano Eugénio*
O homem líquido1 do século XXI é um homem desenraizado, isto é, desligado da profundidade e estabilidade vital que lhe vem das suas raízes. E, nós, cristãos neste mundo, corremos o risco de viver, cada vez mais, este desenraizamento social, existencial e, sobretudo, espiritual.
Verdade seja dita, que não podemos sobreviver se perdermos as nossas raízes. E dado isto, o Santuário de Cristo Rei é, em primeiro lugar, um sinal eloquente de Deus que nos recorda a necessidade vital de vivermos em contato constante com as nossas raízes espirituais e sobrenaturais cristãs. E é, em segundo lugar, o ponto de encontro com estas mesmas raízes.
Assim como a raiz duma videira faz chegar aos sarmentos a sua seiva natural, também este Santuário concede a todos os homens, peregrinos ou visitantes, sobretudo aos que pelo batismo já são cristãos e, graças a isso, já estão unidos pelas raízes da fé e da graça a Deus, a oportunidade de se encontrarem com essas mesmas raízes e receberem o alimento sobrenatural que lhes permita frutificar.
As raízes deste Santuário são também as nossas e apontam na direção espiritual e sobrenatural: da vontade de Deus. Portanto, aqui somos todos convidados e interpelados a mergulhar nas profundezas do oceano do Espírito e a descobrir que as nossas raízes conduzem à santidade.
São Paulo ensina-nos a fazer esta descoberta quando afirma numa das suas cartas o seguinte: “Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação” (1Tes 4,3). Assim sendo, o encontro com as nossas raízes é, sobretudo, um encontro com o chamamento universal de Deus à santidade.
Jesus Cristo não desejava nada mais que fazer a vontade do Pai. Esse era o seu alimento espiritual quotidiano (cf. Jo 4,34). Essa era também a sua missão ao descer do Céu (cf. Jo 6,38; Hb 10,7).
A vontade de Deus e a santidade são assim caras da mesma moeda. Não as podemos separar como se fossem duas realidades independentes. Além do mais, ninguém pode querer ser santo sem que se cumpra nele a Sua Santíssima Vontade (cf. Lc 1,38). Nem podemos sequer pensar que conseguiremos cumprir a vontade de Deus sem ser santos. Todo aquele que não procura seriamente ser santo (“Tomai em sério o vosso proceder nesta vida” – 1Pe 1,17), jamais poderá cumprir a vontade de Deus. A santidade é a que nos capacita para essa obra.
Para qualquer batizado, desejar e procurar estas duas coisas, isto é, cumprir a vontade de Deus e ser santo, deveria ser tão normal que com isso lhe bastaria para ter com que se entreter durante toda a sua vida. Porém, desafortunadamente, as coisas não sempre são assim. Continuam a ser muitos os que crêem que a santidade é algo extraordinário e que não é para “o comum dos mortais” nem está ao alcance de todos. Aos que pensam assim eis aqui a resposta do Senhor: “Tudo é possível a quem crê” (Mc 9,23), “crê somente” (Mc 5,36b).
Se não há mais santos, não é porque Deus não o queira, senão porque nós não cremos que podemos e devemos sê-lo. E, portanto, não pomos os meios para o conseguir. Bastaria um pouco de fé, como um pequeno grãozinho de mostarda, para germinar e crescer (cf. Mt 17,20). E se falta a fé, consequentemente, faltam os santos: “E não pôde fazer ali milagre algum... E estava admirado com a falta de fé daquela gente” (Mc 6,5-6).
Assim sendo, a causa principal da falta de santos é, sem dúvida, a falta de fé. Este é o obstáculo mais frequente, pois o Senhor nos santificará na medida em que creiamos: “Seja-vos feito segundo a vossa fé” (Mt 9,29). Se cremos com fé firme (“Em verdade vos digo: Se tiverdes fé e não duvidares... assim acontecerá” – Mt 21,21-22) e constante (“Mas a constância tem de se exercitar até ao fim, de modo a serdes perfeitos e irrepreensíveis, sem falhar em nada” – Tg 1,4) e Deus fá-lo-á em nós.
1O sociólogo e filósofo polaco Zygmunt Bauman chamou “modernidade líquida” à crescente convicção de que a mudança é a única coisa permanente e a incerteza, a única certeza. *O Pe. José Carlos Eugénio é pároco das paróquias da Sobreda e Vila Nova da Caparica; foi, até ao passado mês de agosto, Capelão do Santuário de Cristo Rei. É Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, em Estudos Eclesiásticos pela Universidade Eclesiástica San Dámaso, Madrid e Mestre em Teologia Espiritual pela Pontifícia Faculdade de Teologia Teresianum, Roma