São José, Patrono da Igreja universal

São José, Patrono da Igreja universal

São José, Patrono da Igreja universal

 

Pe. Armando Azevedo*

 

Fui solicitado para fazer uma pequena introdução a um conjunto de temas sobre S. José neste ano que o Papa Francisco lhe dedicou, assinalando os 150 anos da sua declaração como "Padroeiro da Igreja Universal" pelo Papa Pio IX.

Tomamos como fonte deste e dos artigos que se seguirão nos próximos meses a Carta Apostólica do Papa Francisco "Patris Corde" ("Com coração de Pai"), que é um bonito conjunto de "reflexões pessoais" do Papa neste tempo de confinamento.

Diz o Papa: "Por ter observado o exemplo magnífico de médicos, enfermeiros, trabalhadores dos supermercados, pessoal de limpeza, curadores, transportadores, forças policiais, voluntários, sacerdotes, religiosas e muitos- mesmo muitos- outros que compreenderam que ninguém se salva sozinho (...) muitos pais, mães, avôs, avós e professores mostram às nossas crianças, com pequenos gestos do dia a dia, como enfrentar e atravessar uma crise(...). Todos podem encontrar em S. José - o homem que passa despercebido, o homem da presença quotidiana discreta e escondida, um intercessor, um amparo e um guia nos momentos de dificuldade".

O Papa Francisco também o apresenta como modelo de "pai presente" e sempre ativo, tão necessário na sociedade atual, onde "muitos filhos parecem ser órfãos de pais. A própria Igreja de hoje precisa de pais."

Francisco cita os Evangelhos de Mateus e de Lucas como os únicos lugares da Escritura que nos falam de S. José e da sua pronta obediência à vontade de Deus, apresentando-o como "homem justo", solícito cumpridor da Lei, carpinteiro, "guardião do Redentor" e de Maria, pai amado, pai na ternura, pai na obediência, pai no acolhimento, pai com coragem criativa, pai trabalhador, pai na sombra mas ativo.

Além destas referências históricas, parece-me oportuno referir algumas “probabilidades” sobre S. José. De facto, estudos sobre a história e costumes do povo hebreu, a geografia de Israel e, sobretudo, a arqueologia, dão-nos informações preciosas sobre o que seria a vida normal da Sagrada Família de Nazaré. Costuma-se chamar a estes conhecimentos o "Quinto Evangelho".

Podemos perguntar-nos por exemplo, como, sendo José natural de Belém, no Sul, do clã de Jessé e do rei David, aparece no Norte, e na humilde e pobre aldeia de Nazaré, onde decide casar com Maria? Diz-nos a história que o rei Herodes, o Grande, aquele que quis matar o Menino Jesus, 4 anos antes do nascimento de Cristo, dividiu o território do seu império pelos seus filhos, ficando Herodes Antipas com a Galileia e Pereia e Filipe com a parte oriental do Jordão. Antipas estabeleceu-se em Tiberíades, mas não gostou dessa cidade como capital. Construiu, então, a cidade de Séforis para ser capital, a qual ficava a cerca de 7 km da atual Nazaré. Antipas procurou artífices para a construção e, assim, se pode compreender por que ali terá aparecido José "o carpinteiro"(Mt.13,55) integrado na construção da cidade. 

Talvez porque um grupo de agitados zelotas se tenha revoltado contra os romanos, o que sabemos é que uma Legião Romana invadiu a cidade e destruiu-a. A população teve que procurar abrigo nas aldeias vizinhas. Assim, tanto José, como a família de Joaquim e Ana, os pais da Virgem Maria, se teriam sediado em Nazaré, pequena aldeia de uns 40 habitantes, pois, só havia uma pequena fonte para abastecer a povoação. Parte dessa família terá ido para Caná, situada a igual distância de Séforis. Assim se compreende bem porque Maria está ativa no casamento de Caná (Jo.2,1-12); devia tratar-se da boda de algum familiar, tendo sido Jesus também convidado, e ali fez o seu primeiro milagre.

Supõe-se que José tenha sido um dos carpinteiros da construção de Séforis e que também se tenha refugiado em Nazaré, onde conviveu e depois casou, com Maria. Claro que são apenas suposições, mas que parecem lógicas e explicam muitas questões para as quais faltam explicações claras. Deus tinha escolhido José, o “Homem justo”, para ser o pai legal de Jesus e assim O tornar descendente de David como tinham anunciado os profetas, soube providenciar os acontecimentos para em Nazaré se encontrarem José e Maria.

Quem visita Nazaré, pode ir às ruínas da “casa de S. José”, situada a uns 30 metros da “Casa de Maria”, onde o anjo a visitou. “Aqui o Verbo se fez Carne”, lê-se numa inscrição. Essa casa de José tornou-se mais tarde lugar de reuniões de comunidades cristãs primitivas que transformaram a “mikvá” (piscina de abluções familiares entre os judeus) em “piscina batismal”. A casa ficou incluída numa igreja ali construída, podendo-se ainda hoje visitar as ruínas.

Outra questão que se coloca sobre S. José é a altura da sua morte. A última vez que se fala de José no Evangelho é em Lucas 2, 48. Aos 12 anos Jesus perdera-se em Jerusalém e, quando O encontram, a sua mãe dirigiu-se a Ele nestes termos: “Meu filho, porque procedeste assim connosco? Teu pai e eu, aflitos, te procurávamos”. E logo a seguir, no vs. 51, Lucas refere: “Desceu então com eles para Nazaré e era-lhes submisso”. No Evangelho nunca mais se fala de José, pai solícito, mas silencioso. 

Como era costume entre os judeus, pertencia aos pais a obrigação de educar os filhos na fé e transmitir-lhes as tradições de seus antepassados. Foi o que fez José, ensinando-lhe também a sua profissão, “carpinteiro”, palavra que na sua origem significa: “construtor de casas”. O “carpinteiro”, de modo diferente a como o entendemos hoje, fazia um pouco de tudo. Sabemos que mais tarde Séforis foi reconstruída por Antipas. Terão ali trabalhado José e Jesus? Ignoramos. Mas mais tarde Jesus dirá: “O trabalhador merece o seu salário”. Quando Jesus começa a sua vida pública por volta dos 30 anos, os Evangelhos falam de Maria, mas não de José. Supõe-se que já teria morrido.

Desde os primeiros tempos do cristianismo São José é invocado como “Patrono da Boa Morte”, porque certamente teve a presença de Jesus e Maria junto de si, quando deixou este mundo e partiu para Deus. Invoquemo-lo também para a hora da nossa morte.

A reflexão do Papa Francisco sobre a vida de São José, transmitida na sua Carta Apostólica “Com coração de Pai”, é simples, bela e oportuna para a “sociedade de hoje e para a Igreja”.

Nestes tempos de muitas transformações sobre o conceito e organização da família, o Papa apresenta-nos São José como modelo de pai cumpridor, silencioso, mas consciente cuidador da Família de Nazaré, trabalhador e modelo das famílias cristãs. Apresenta-o também como protetor dos emigrantes que passam por imensas dificuldades, como ele passou quando foi imigrante no Egito, “guardião da Igreja”, à imagem de como guardou Jesus de tantos perigos; dos miseráveis, necessitados, exilados, aflitos, pobres e moribundos, de todos os trabalhadores porque também ele o foi e protetor muito especialmente de todos os pais.

Vale a pena ler e refletir sobre este pequeno, mas importante documento do Papa e a todos convido a que o façam. 
Que São José ilumine e proteja as nossas famílias, e seja por elas descoberto como modelo de “Pai”, segundo a vontade de Deus!
  

* O Pe. Armando Azevedo é atualmente Capelão do Santuário de Cristo Rei
Sexta, 12 de Fevereiro de 2021