Padre Carlos Filipe (reitor do Santuário de Cristo Rei)
Ao pensarmos no mistério da Santíssima Trindade que se revelou a nós pela Incarnação do Verbo de Deus, não podemos deixar de pensar nos pais de Jesus, Maria e José, e no extraordinário acolhimento da vontade de Deus, pela aceitação do drama humano heroicamente vivido nas diferentes etapas deste processo.
Ambos acolheram o menino Jesus em circunstâncias difíceis, quase impossíveis para as simples forças humanas. Mas cada um a seu modo, e na união da graça sobrenatural recebida na relação conjugal, assim O receberam.
No caso de S. José, a primeira etapa deste acolhimento foi o de sua esposa, a Virgem Maria. Sem a concessão feita por José a Maria, de a receber acreditando num desígnio maior pelo qual seria razoável aceitá-la mesmo com um Filho estranho à relação de ambos, o desfecho da História seria diferente. Como nos diz o Papa Francisco: “José acolhe Maria, sem colocar condições prévias” (Carta Apostólica Patris Corde, p. 18, ed. Paulinas, 2020).
Acolher o conjuge da parte de Deus será a partir deste acontecimento algo verdadeiramente desejável e recomendável pelo exemplo e intercessão cristã de S. José. O próprio Deus nos oferece um paradigma de acolhimento para aqueles chamados ao matrimónio. Em última análise, podemos com certeza afirmar que é Deus quem escolhe os casais em vista de um desígnio maior, segundo a sua Sabedoria divina, pelo qual nos incluímos na história divina que Deus quer fazer connosco. Cabe-nos aceitar responsavelmente este dom, na doação da própria vida, como nos relembra o Papa: «Deus ajudou-o [S. José] a escolher, iluminando o seu discernimento» (Ibidem, p. 19).
Aceitar responsavelmente significa antes de mais acolher. Um caminho espiritual que São José nos aponta em grau excelente, como nos diz o Papa: “A vida espiritual que José nos mostra não é um caminho que explica, mas um caminho que acolhe” (Ib., p. 19). Diz mais, ao referir que só acolhe quem se reconcilia com a própria história, precisamente porque reconhece nesta um significado mais profundo (cf. Ibidem, p. 19).
Toda a trama da nossa história pessoal deve ser antes de mais aceite e acolhida como desígnio de um Outro, no qual reconhecemos o sentido último, a verdade, a bondade e a beleza de um caminho acompanhado, com o “realismo cristão, que não deita fora nada do que existe» (Ibidem., p. 21).
Faço testemunho da vida de tantos casais com que convivi, que de modo mais ou menos consciente perscrutam este desígnio de vida na aceitação do conjuge, não somente na ocasião da boda matrimonial, mas ao longo de toda uma vida voluntariamente aceite e acolhida. E como nos testemunham que Deus abençoa este caminho!
Peçamos a intercessão de S. José por aqueles que se propõem constituir família: que o Senhor lhe conceda a graça de ‘esperar’ o conjuge por Deus escolhido, de o aceitar e acolher no horizonte de uma história maior; e assim, reconciliados consigo próprios no acolhimento de um outro, sejam capazes de acolher o próprio Deus que sempre nos procura nos caminhos da vida.
São José, rogai por nós!