Este mês propomos o livro: O pequeno caminho das grandes perguntas. O autor é sobejamente conhecido de muitos, crentes e não crentes: o cardeal José Tolentino Mendonça. Trata-se de um teólogo e poeta empenhado em construir pontes e estabelecer diálogos entre os diferentes campos do saber e entre todos aqueles e aquelas que se dispõem a trilhar caminhos também com quem pensa diferente.
O livro que propomos é muito inspirador, merecendo ser lido devagar, com vagar interior, quero dizer. É constituído por pequenas reflexões, de não mais de uma página cada uma, e por isso podemos lê-lo de forma descontinua, saltando para a parte que mais nos chamar a atenção; podemos lê-lo todo ou só uma parte e retomá-lo tempos depois, o que não podemos é lê-lo à pressa como quem despacha um livro mais.
Somo desafiados a ampliar o olhar, a não nos resignarmos a visões demasiado estreitas sobre os acontecimentos, sobre os outros e sobre nós mesmos.
Numa sociedade excessivamente pragmática, mais educados e habituados a procurar respostas certas, seguras e comprovadas, o Cardeal Tolentino Mendonça vem recordar-nos a importância das perguntas.
Importa não deixar de interrogar-nos e interrogar a realidade que insiste em não se deixar esgotar e que é sempre maior que as nossas certezas. Somos chamados não só a explicá-la, a querer compreendê-la, mas, também e sobretudo, a acolhê-la naquilo que tem de mistério. Somos desafiados a fazer-nos essas perguntas que agora parecem estar fora de moda, mas que desde sempre, e também hoje, são as questões fundamentais do ser humano: que sentido tem a vida (a minha, a dos outros, a do mundo), para quem vivo, a quem pertenço, para onde caminho, de onde venho?
Assim o diz Tolentino Mendonça:
“Há um momento em que percebemos que as perguntas nos deixam mais perto do sentido, da abertura do sentido, do que as respostas. Que as respostas são úteis, sim, que precisamos delas para continuar a viver, mas que a vida transforma as próprias respostas em perguntas. E não perguntamos necessariamente por nos termos enganado ou por considerarmos insuficiente a experiência que fazemos. A pergunta é a grafia da excedência com que a vida se manifesta…. Deveríamos dedicar mais tempo a escutar essas perguntas que pulsam no nosso interior, soterradas no atordoamento dos dias, omitidas pelo pragmatismo ou pelo medo, adiadas para um momento ideal que depois nunca é.”
É certo. Corremos o risco de viver quase de forma autómata, agitados e preocupados com o dia-a-dia, a sua azáfama e os seus múltiplos afazeres e não é que isso seja mau, mas certamente não é suficiente. Talvez a pandemia tenha trazido a oportunidade de, num certo vazio de agenda, parar e fazer-nos perguntas; sabemos que para muitos de nós foi incómoda esta “paragem forçada” e essa incomodidade não teve apenas a ver com a tragédia que a pandemia significou para muita gente a nível de saúde ou financeiro. Sentimos uma dificuldade que tinha a ver com outra coisa, com o facto de, de repente, ter tempo, tempo para parar, já sem escusas. E isso custou-nos. No livro proposto o autor comenta:
“Porque nos resistimos tanto a parar e encontrar formas de repouso que nos devolvam a nós próprios? Por uma razão simples: o movimento parece-nos mais fácil de viver. Ele preenche o tempo, mantém-nos ocupados dentro dos seus círculos em vertigem, enquanto o repouso tantas vezes começa com a sensação de um esvaziamento, surpreendente, incómodo, duro de lidar. Por isso fugimos do repouso verdadeiro em que o encontro connosco mesmos é inexcusável.”
No fundo, a leitura pausada deste livro pode ser uma forma de parar e repousar. Com a linguagem poética e bonita a que já nos habituou, o autor dá-nos pistas para pensar e repensar o modo como vivemos a vida, as relações, a natureza e a fé. Vale muito a pena!