Ao falarmos sobre obediência, de imediato pensamos na renúncia à própria vontade para fazer a vontade de alguém que tem “poder” sobre nós. E isso não deixa de ser verdade, nem na vida de São José e de Nossa Senhora, nem na dos santos, nem na vida daqueles que o próprio Senhor chama para o Seu serviço na Igreja.
A vontade de Deus é sempre boa, perfeita e agradável, mas nem sempre é fácil obedecê-la, visto que somos vacilantes e “fazemos o mal que não queremos e não fazemos o bem que queremos”, como diria São Paulo (cf. Rm 7, 19).
A missão de maior responsabilidade na Igreja Católica é assumida pelo Sumo Pontífice, homem escolhido dentre os cardeais de todo o mundo para ser o Vigário de Cristo. Obedecer é o primeiro passo desse ministério que tantos papas já desempenharam. Mas… E se falarmos de renunciar por amor a essa mesma missão?
No dia 11 de fevereiro de 2013, o mundo foi surpreendido pelo anúncio feito pelo Papa Bento XVI: renunciaria à Cátedra de Pedro. A renúncia foi efetivada no dia 28 de fevereiro, quando o Papa deixou os aposentos papais.
Sem dúvida, não deve ter sido uma decisão fácil! Não foi apenas a voz da sua consciência ou a saúde frágil, mas a necessidade de cumprir fielmente o querer de Deus que o levou a tomar essa decisão.
No livro-entrevista “Conversas Finais – uma conversa com Peter Seewald”, Bento XVI fala sobre tudo, desde a infância, passando pelo Concílio Vaticano II até chegar à renúncia e ao silêncio no convento Mater Ecclesiae, onde passou a viver ao tornar-se bispo emérito de Roma.
O mais bonito desta obra é o modo como o autor respeitosamente apresenta as questões e como, sem medo e cheio de emoção, o Papa emérito responde a cada pergunta.
Ao iniciar o capítulo sobre a renúncia, que encontramos logo no início do livro, o qual não segue uma ordem cronológica, Peter questiona o Santo Padre:
“Chegamos àquela decisão que, por si só, faz com que o seu pontificado já pareça histórico. A sua renúncia marca a primeira vez na história da Igreja em que um pontífice em pleno exercício da sua função deixa voluntariamente o cargo (...) Já em 2010 declarou no seu livro ‘Luz do Mundo’: ‘se um papa não estiver em condições físicas ou psíquicas de exercer o seu mandato, tem o direito, e às vezes até mesmo a obrigação, de abdicar de sua tarefa’. Ainda assim, houve forte conflito interior para chegar a essa decisão?”.
Bento XVI inicia a sua resposta com um profundo suspiro e diz:
“Claro, não é tão simples, naturalmente. Nenhum papa renunciou nestes mil anos, e isso também foi uma exceção no primeiro milénio: então, é uma decisão à qual não se chega com facilidade (...) Por outro lado, para mim, a evidência de fazê-lo na época era tão grande que não houve nenhum conflito interior doloroso naquele momento. A consciência da responsabilidade e da gravidade dessa escolha, exige um discernimento contínuo e escrupuloso, também diante de Deus e de si mesmo, isso sim, mas não é que me tenha deixado, por assim dizer, em frangalhos”.
O jornalista questionou o Papa Emérito ainda, sobre a frase “não abandono a cruz”, dita com ênfase pelo pontífice na sua despedida. Sobre ela, Bento XVI disse:
“Alguém havia dito que eu estaria descendo da cruz, que estaria procurando uma situação confortável. É uma acusação com a qual eu já contava. Precisei lidar com ela, principalmente no meu íntimo, antes de tomar a decisão. Tenho a convicção de que não foi uma fuga nem uma renúncia provocada por pressões externas, pois não houve tal (...) Ao invés disso, é outra maneira de permanecer ligado ao Cristo sofredor, na quietude do silêncio, na grandeza e intensidade da oração por toda a Igreja. Por isso, o meu passo não é uma fuga, mas um outro modo de permanecer fiel ao meu ministério”.
Em todo o livro é possível perceber o grande desejo do Papa Emérito em agradar o coração de Deus e fazer somente a Sua Divina Vontade. Como no caso da renúncia ao papado, nem todas as decisões foram ou são fáceis para ele, mas isso não o impede de seguir o querer dAquele que o chamou.
Sobre o livro, no jornal The Catholic Times, podemos encontrar a seguinte nota: “A declaração mais sincera de Bento XVI em toda a sua vida. Sem dúvida, é um livro essencial!”.
Vale a pena ler “Conversas Finais” para entender e contemplar as maravilhas que Deus realizou na vida do Papa Emérito Bento XVI, desde o seu nascimento até à renúncia ao cargo mais elevado da Igreja Católica.