Este mês sugerimos o livro “História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar”, do escritor Chileno, recentemente falecido, Luís Sepúlveda.
Um livro pequeno, bonito e simples que nos devolve um certo encanto do mundo. Pode ser lido por crianças e jovens, mas é sem dúvida uma boa opção para nós adultos, que tanto necessitamos reavivar a capacidade de assombro e um olhar desprevenido e bondoso sobre as coisas, os acontecimentos e as pessoas.
Nesta história os animais são capazes de sentimentos nobres, capazes de lealdade e coragem. E não apenas com os que são da sua raça.
Uma gaivota é apanhada pela “maldição dos mares”, uma mancha de petróleo que lhe dificulta o voo. Com custo chega a Hamburgo, a um terraço onde se encontra com Zorbas, um gato grande, preto e gordo.
Este, na ausência dos seus donos, preparava-se para um tempo de descanso e “boa vida”, mas esses seus planos são interrompidos e tem que introduzir na sua cómoda vida de gato uma enorme responsabilidade… Sentindo-se morrer, a gaivota põe um ovo e confia-o a Zorbas, o qual se vê obrigado a fazer três promessas: não comer o ovo, cuidá-lo e ensinar a voar a gaivotinha que dele nascer.
Promessas difíceis de cumprir para um gato! E Zorbas só conseguirá cumpri-las com a colaboração de outros membros da comunidade. Todo o livro fala de interajuda, lealdade e esforço em cumprir o compromisso assumido e de uma bonita amizade que leva o gato a querer que a gaivota seja gaivota e possa voar alto.
Durante algum tempo a gaivotinha, criada entre gatos, julgava-se também ela um gato. Chega, então, o momento de uma conversa séria entre ela e Zorbas, diálogo fundamental para o esclarecimento da sua identidade:
“Gostamos de ti porque és uma gaivota, uma linda gaivota. Não te contradissemos quando te ouvimos grasnar que és um gato, porque nos lisonjeia que queiras ser como nós; mas és diferente, e gostamos de que sejas diferente. Não pudemos ajudar a tua mãe, mas a ti sim. Protegemos-te desde que saíste da casca. Demos-te todo o nosso carinho sem nunca pensarmos em fazer de ti um gato. Queremos-te gaivota. Sentimos que também gostas de nós, que somos teus amigos, a tua família, e é bom que saibas que contigo aprendemos uma coisa que nos enche de orgulho: aprendemos a apreciar, a respeitar e a gostar de um ser diferente. É muito fácil aceitar e gostar dos que são iguais a nós, mas fazê-lo com alguém diferente é muito difícil, e tu ajudaste-nos a consegui-lo. És uma gaivota e tens de seguir o teu destino de gaivota. Tens de voar.”
Faz-nos falta esta aprendizagem diária de querer e contribuir para que os outros sejam eles próprios, diferentes de nós. Assim com os nossos filhos, com os colegas de trabalho, com os amigos, com os que chegam ao nosso país vindos das mais diferentes culturas e religiões. A diversidade assusta-nos, mas enriquece-nos, faz-nos crescer por dentro.
Uma história bonita de amor criativo e que nos faz bem aos humanos, os quais aparecem aqui como ameaça, mas também como capazes de poesia e sonho, capazes de ensinar a voar.
Quase ao final do livro encontramos este diálogo entre o gato e o humano que ajudou a gaivotinha a voar e que pode interpelar-nos neste tempo de verão em que muitos temos a oportunidade de descansar e renovar forças:
“À beira do vazio compreendeu o mais importante - miou Zorbas.
-Ah, sim? E o que é que ela compreendeu? - perguntou o humano.
-Que só voa quem se atreve a fazê-lo - miou Zorbas.”