Este artigo integra o itinerário mensal de preparação espiritual para a celebração dos 100 anos da Instituição da Solenidade de Cristo Rei.
Um dos grandes desafios ao celebrarmos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, reside em fazer com que este acontecimento litúrgico, vivido nos altares, se prolongue na vida quotidiana dos fiéis como resposta de fé concreta e diária. O Senhorio de Jesus deve estender-se à nossa vida ordinária, manifestando-se nas pequenas escolhas e nos gestos simples do dia-a-dia.
Neste artigo, somos impelidos à reflexão: vivemos, de facto, sob a Soberania do Senhor? Deus é verdadeiramente o Senhor das minhas escolhas quotidianas? E, se Deus é soberano, por que razão acontecem coisas más a pessoas boas? A Soberania do Senhor livra-nos das tentações de cada dia?
Muitas são as interrogações que surgem quando submetemos a nossa vontade à Vontade soberana de Deus. Contudo, a Sua Bondade e Justiça vão infinitamente além do que conseguimos compreender.
Alinhar a nossa visão com a Sabedoria divina e com a Sua Palavra é um caminho de transformação interior, onde acolhemos humildemente uma nova forma de ser e de ver o mundo. Quando interrogado por Pilatos, Jesus afirmou:
«O Meu Reino não é deste mundo. Se o Meu Reino fosse deste mundo, os Meus guardas teriam lutado para que Eu não fosse entregue aos judeus. Mas o Meu Reino não é daqui.» (Jo 18,36)
Com estas palavras, Cristo não rejeita o mundo, mas revela que o Seu Reinado não segue a lógica do poder humano. O Seu Trono é a Cruz, a Sua Coroa é de espinhos, e o Seu Ceptro é o Amor. Jesus Reina pelo serviço, pela fidelidade e com Amor incondicional. Revela a Sua Soberania não com a espada, mas com a Palavra; uma Palavra que ilumina os que andam nas trevas, cura os feridos, liberta os oprimidos, sacia os que têm fome e sede de justiça, e anuncia, com autoridade, um tempo de graça.
Confiar em Deus pelo que Ele é
Uma das respostas à pergunta «se Deus é soberano, por que temos de sofrer?» encontra-se neste acto profundo de fé: a confiança. Confiar que Deus sabe o que é melhor para nós. Ele é sábio, justo e amoroso.
«Porque d’Ele, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele a glória pelos séculos! Ámen.» (Rm 11,36)
Mesmo que atravessemos provações, devemos confiar que Ele permanece no controlo, governa todas as coisas e providenciará o necessário. Só Jesus foi capaz de transformar todas as dores, flagelos e angústias num triunfo glorioso. Sendo Deus, experimentou as dores humanas e, ao subir à Cruz, assumiu os sofrimentos para cumprir os desígnios do Pai e redimir a humanidade.
Ficar zangado com Deus pelas situações que não compreendemos de nada serve. Precisamos, sim, de aprender a confiar como o próprio Cristo confiou. Mesmo diante da dor, Ele não se revoltou, não se desesperou, não se abateu. Aceitou, teve ânimo, coragem e fé no Pai que, por fim, O transfigurou e O fez ressurgir glorioso.
Nos momentos de exaustão ou desânimo, somos tentados a crer que Deus não vê a nossa dor. Mas é precisamente nesses momentos que devemos afirmar com ainda mais fé: Ele é a resposta para tudo o que vivemos. Confiar as nossas necessidades diárias à Sua Misericórdia, com a oração:
«Jesus, pela Vossa dolorosa Paixão, eu confio em Vós.»
Pois Ele está à porta e bate. Se O deixarmos entrar, será sal e luz para o nosso dia-a-dia.
O Rei que caminha connosco
Ao contrário dos reis deste mundo, que se isolam em palácios, Cristo é o Rei que permanece no meio do Seu povo. Nasceu numa manjedoura, viveu entre os pobres, foi filho de um carpinteiro, tocou os doentes, acolheu os marginalizados, caminhou lado a lado com os discípulos, lavou-lhes os pés e chorou a morte do amigo Lázaro. Todos estes gestos revelam uma Realeza feita de proximidade e não de superioridade.
Jesus viveu o Seu Senhorio no dia-a-dia — no encontro com os amigos, na família, no trabalho, na comunidade. A Sua autoridade não se impôs por mandamentos frios, mas pelo calor de um Coração que acolhe, ilumina e transforma.
O Reino começa no coração
Antes de transformar o mundo, Cristo deseja transformar os corações. Quer estabelecer a Sua Bondade e Soberania no mais íntimo do nosso ser: nos pensamentos, nos afectos, nas escolhas e nos projectos. Como escreve São Paulo:
«Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim.» (Gl 2,20)
Quando o Reinado de Cristo acontece na alma, ela adere, com liberdade e confiança, aos desígnios de Deus. E compreende que os planos de Deus são sempre melhores do que os nossos.
Viver sob o Seu Senhorio: gestos concretos
Submeter a nossa vontade à de Deus santifica a vida quotidiana. Eis alguns gestos práticos:
1. Colocar Jesus no centro das decisões
Cristo não deseja ser lembrado apenas nas dificuldades ou ao Domingo. Ele quer estar no centro da nossa vida. Consultá-Lo nas grandes e pequenas decisões — na educação dos filhos, na vida profissional, nas relações — é viver segundo o Evangelho. Um bom exercício é perguntar:
«O que Jesus faria no meu lugar?»
2. Acolher a Palavra com docilidade
Cristo Rei fala-nos através da Sua Palavra. Escutá-La é permitir que Ele molde o nosso interior. A Lectio Divina é um caminho fecundo de encontro com a Vontade de Deus.
3. Viver a caridade como forma de autoridade
No Reino de Cristo, quem quiser ser grande, seja o servidor de todos (cf. Mt 23,11). A verdadeira autoridade manifesta-se no Amor concreto aos irmãos, especialmente aos mais frágeis: perdoar, consolar, acolher, escutar, partilhar.
4. Participar da vida sacramental
A Eucaristia é o centro da fé cristã. Participar na Santa Missa, confessar os pecados, alimentar-se da Palavra e do Corpo de Cristo são caminhos essenciais para permitir que Ele reine plenamente em nós.
5. Combater o pecado e o egoísmo
Viver sob o Senhorio de Cristo é travar um combate espiritual diário. O pecado fecha-nos ao Amor. A oração, o discernimento e os sacramentos ajudam-nos a vencer o orgulho, a vaidade, a preguiça, a mentira — e a crescer na liberdade dos filhos de Deus.
O Reino de Cristo nas estruturas do mundo
O Senhorio de Cristo não é apenas pessoal. Ele deve irradiar-se nas estruturas da sociedade. Quando um cristão vive com coerência, caridade, verdade e esperança, contribui para que o Reino de Deus transforme o mundo: na política, na economia, na cultura, na educação, nas relações humanas.
Cristãos comprometidos são fermento no meio da massa (cf. Mt 13,33), sal da terra e luz do mundo (cf. Mt 5,13-14). São construtores do Reino aqui e agora.
A escolha por Cristo Crucificado
Submeter-se a Cristo Rei é uma escolha diária. Cada manhã é uma nova oportunidade para Lhe consagrar a vida: os familiares, os desafios, os sofrimentos e as alegrias.
No alto da Cruz, entre dois ladrões, um deles reconheceu a Realeza de Cristo e, com humildade, entregou-se à Sua Misericórdia. E escutou a promessa:
«Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso.» (Lc 23,43)
Para Cristo Rei, o que conta é o hoje. Ele quer reinar agora, no nosso presente, na nossa fragilidade, na nossa dor. Basta uma só Palavra d’Ele, e seremos curados.
Rezemos com confiança:
«Senhor Jesus, reina em mim. Que os meus pensamentos, palavras e acções sejam para Tua glória. Reina na minha casa, na minha família, no meu trabalho. Sê a minha força e a minha paz. Confio em Vós. Reina na minha fraqueza e conduzi-me à alegria do Vosso Reino eterno.»
Uma resposta
Ao ler isto achei extraordinário não haver ainda comentários, Cristo é verdadeiramente Rei e Senhor e o que está escrito convida com simplicidade e passos práticos a uma relação íntima constante e diária na sua presença, espero que abençoe e inspire muitos que leiam estas palavras a procura Cristo Real e Vivo hoje.